A economia costuma funcionar oras como um círculo virtuoso, oras como um círculo vicioso. Ou seja, normalmente as reações ocorrem em efeito cascata. Há sempre pontos fora da curva, mas os ciclos econômicos históricos costumam ter picos em que quase tudo dá muito certo ou dá muito errado. E o principal combustível dessa dinâmica é a confiança – ou a falta dela. É por isso que os mercados são suscetíveis a praticamente todos os fatores da vida social. Na verdade, os mercados são, em última análise, as próprias pessoas, que têm entre si relações de cunho pecuniário.
Digo isso, em caráter de introdução, para analisar a atual situação do país. Surgem sinais, em que pese ainda sem total confirmação, dando indícios de que, ao menos, paramos de cair. Em outras palavras, parece que a pior fase do turbilhão econômico vivido nos últimos anos começa a arrefecer um pouco. Pouco, repito. Isso ainda levará tempo para gerar efeitos sociais diretos, mas ao menos já serve para mudar o ambiente anímico de quem investe, decide e mexe os ponteiros do cotidiano.
Agora, cabe aos atores políticos e econômicos agir no cenário para que essa tendência se confirme. Tudo deve ser feito, obviamente, de maneira consistente e responsável. O excesso de intervencionismo do estado na economia nunca deu muito certo, vide os exemplos mais recentes. Mas há instrumentos para que o poder público acelere o ambiente de diminuição da recessão e de retomada do crescimento. A roda precisa girar novamente para o lado da virtude, e isso deve acontecer de maneira orgânica e não artificial.
As notícias da última semana dão conta de que o IPCA desacelerou pelo segundo mês consecutivo, resultado que chegou a surpreender. Registrou leve alta de 0,08%, abaixo das previsões que indicavam alta de 0,19%. A taxa é a menor para o mês desde 1998, quando houve uma deflação de 0,22%. Considerando todos os meses, é o menor número desde julho de 2014, que ficou em 0,01%.
Claro que o resultado precisa ser recebido com equilíbrio e serenidade, mas as pessoas parecem estar percebendo e reforçando uma mudança de cenário. E tal situação passa a reforçar a tendência e a necessidade de baixar juros, o que será deliberado nos próximos dias em uma nova reunião do Copom. Fatores ligados aos setores de alimentos e a serviços podem ajudar a melhorar os riscos sobre os índices de preços e dar o conforto para que o Banco Central comece a cortar gradualmente os índices.
A diminuição da Selic pode ficar, no mínimo na casa de 0,25 ponto percentual e em novembro poderia ter uma nova queda. O fato é que os ingredientes do cenário micro e macroeconômico já dão substância para essa importante mudança, e isso implica diretamente no ânimo da economia e no estímulo ao crescimento. É o círculo virtuoso, de que falei.
O governo precisa intensificar, no entanto, o processo de arrumar a casa. Não pode dar sinais erráticos de irresponsabilidade e descontrole dos gastos públicos. Nesse sentido, ganha importância a aprovação da PEC que limita os gastos públicos e, por consequência, cria um novo regime fiscal. Encaminhada pelo governo à Câmara dos Deputados, o projeto prevê a fixação de limite para despesas públicas federais dos três poderes e determina que o aumento dos gastos não seja maior que a inflação do ano anterior. Se aprovado pelo Congresso, o novo regime fiscal já entrará em vigor no próximo ano, com prazo de validade total de 20 anos.
A essência do projeto é a atualização da despesa primária de 2016 pelo IPCA e sua utilização como limite no exercício de 2017. Para os 19 anos seguintes, a regra se repete: vale a atualização pelo IPCA da despesa do ano anterior e a aplicação do resultado como o limite para o ano corrente. Em caso de descumprimento, fica vedada a concessão de vantagem, aumento, reajuste ou readequação de remuneração de servidores públicos. Também ficará proibida a criação de cargo, emprego ou função, bem como a realização de concurso público.
Claro que o tema é polêmico e precisa ser analisado no detalhe, especialmente no que concerne às áreas essenciais, como saúde e educação. Entretanto, inclusive e principalmente nesses casos, o problema está na qualidade do gasto público. Então, chegou a hora de o Brasil, para além de pensar em ampliar investimentos, uma ideia sempre mais fácil e politicamente palatável, cuidar melhor do dinheiro que já aplica. Essa transformação, de ordem legal e cultural, será importante para que o país recupere sua credibilidade interna e externa e volte a crescer de maneira consistente.
Não é hora de sinais trocados. A queda na taxa de juros e a aprovação da limitação de gastos públicos são medidas que atuam em dinâmicas diferentes, mas ambas sinalizam para o mesmo caminho de reconstrução. A sociedade brasileira e a comunidade internacional precisam entender que o Brasil está efetivamente disposto a sair da recessão. Para isso, é necessário reconstruir o equilíbrio fiscal e promover o crescimento econômico – uma equação que deve ocorrer em concomitância. Que saibamos acertar o passo, sem mais esperar.
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