A greve geral ocorrida na última sexta-feira, embora contestada politicamente, é no mínimo compreensível – e deve ser respeitada. O descrédito da classe política, a má avaliação do governo, o alto índice de desemprego, as denúncias de corrupção e as reformas mal comunicadas deram caldo suficiente para as manifestações comandadas pelos sindicatos. É do jogo democrático, um direito materializado constitucionalmente. O que não é aceitável, porém, é a desordem e a violência – cenas que, infelizmente, também aconteceram. Ocorre uma inversão legal quando a greve sobrepuja outros direitos individuais e sociais ocorre, e a própria causa sai perdendo. A população comum, sem aderência partidária, ideológica ou corporativa, respeita protestos ao mesmo tempo em que rejeita vandalismos.
Mas a grande questão de fundo – e de conteúdo – é a seguinte: para além da negação das reformas apresentadas pelo governo Temer, que alternativa tais movimentos colocam na mesa da sociedade brasileira? Esse me parece o ponto mais vulnerável do discurso de boa parte dos que comandaram o levante das oposições na semana passada. Criticaram muito as iniciativas do Executivo, mas não articularam qualquer contraproposta. E, nessas alturas da história brasileira, não basta mais ser apenas do contra – até porque os grandes grupos políticos já estiveram no governo, agora ou recentemente. E todos sabem que é preciso mudar o sistema previdenciário e as leis trabalhistas. Os ex-presidentes Lula e Dilma, a propósito, quando exerciam seus mandatos, chegaram a verbalizar as mesmas teses que agora seus apoiadores rechaçam. Trata-se de um fato que vale recordar para fins de coerência, apenas.
Então, quem tem reto interesse em colocar o país nos trilhos novamente sabe que o déficit da previdência passou dos limites. E que, se nada for feito, os pobres serão os mais atingidos. É necessário caminhar para a unificação dos regimes público e privado. Não se pode mais aceitar que, para um mesmo povo que paga impostos, haja tipos de seguridade social diferentes. O Brasil não aceita mais a ideia de cidadãos de duas categorias. O povo pede igualdade e justiça social.
Também é de bom senso perceber que, diante de quase 14 milhões de desempregados, mudanças na legislação trabalhista, sem perda de direitos previstos na Constituição, podem gerar mais oportunidades aos que hoje estão procurando. Diante de famílias passando necessidades reais, não convém fazer apenas disputa de teses. É preciso ter proposta prática. Se não vale a do governo, que outra mudança é possível? Assim como está é que não pode continuar. A legislação, em muitos casos, joga contra o mundo da produção e do trabalho.
Não gostar do governo e ser contra as reformas, tudo isso faz parte do movimento de forças de uma democracia. Todavia, diante de uma crise de proporções gigantescas, o debate não pode ficar paralisado no revanchismo ou no jogo do “quanto pior, melhor”. Está tudo errado, mas nada muda? Não! O Brasil precisa de reformas profundas – e, a meu juízo, deveriam ser ainda mais amplas, alcançando o sistema tributário, o sistema político e o pacto federativo. Que se faça um diálogo construtivo, portanto. Mesmo que acirrado, mas sempre propositivo. É a sustentabilidade do Brasil que está em jogo.
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