Tenho falado sobre o pouco tempo que o governo Temer possui para gerar um clima de confiança política e econômica no país. Por enquanto, a desconfiança segue sendo majoritária no sentimento das pessoas. Na área da economia, apesar da positiva aprovação de uma nova meta fiscal pelo Congresso, a equipe econômica ainda não teve tempo de, efetivamente, colocar as cartas na mesa. Mesmo com os bons nomes que formam o Ministério da Fazenda e o Banco Central, certa dúvida ainda paira no ar sobre o que virá pela frente.
O certo é que o mandato de Temer não poderá repetir soluções banais e tampouco jogar para torcida no curto prazo. As circunstâncias são diferentes do que em qualquer outro momento. Algumas das medidas que o presidente interino precisará tomar exigirão, necessariamente, capacidade de enfrentamento de influentes setores. No português bem claro: comprar brigas. Isso envolve fazer a famosa guerra da comunicação, no que a oposição é especialista, e a batalha político-parlamentar propriamente dita, no que o governo armou-se bastante bem.
Veja-se o caso da reforma da previdência. O sistema é insustentável, ninguém mais tem dúvida nesse diagnóstico. Algo é preciso ser feito, mas esse “algo” significa rever, desde logo, ou ao menos para o futuro próximo, algumas regras até aqui estabelecidas. Não escaparemos, por exemplo, de mexer na idade mínima da aposentadoria. Imaginem a movimentação dos grupos de pressão a respeito disso. Imaginem a reação da oposição e dos sindicatos. Imaginem as repercussões e rótulos que o governo irá receber. Conseguirá lidar com tamanha pressão?
Ainda na economia, o ciclo de retomada do crescimento não volta a acontecer tão facilmente. Antes é preciso arrumar um pouco a casa, o que inclui cortar custos, baixar despesas, acabar com privilégios, rever contratações, enfim, diminuir o tamanho da máquina pública. E, além de tudo isso, haverá a implicação do contingenciamento orçamentário, com menos investimento vindo direto do Tesouro. Também aqui, como se vê, teremos o fomento de uma série de pequenos e grandes conflitos pelos quais o governo terá que passar.
A contradição que vive Temer reside, portanto, nessa dubiedade de pressas: ele precisa, ao mesmo tempo, serenar o país, recuperar a confiança, mas fazer mudar estruturas – ou seja, gerar algumas desconfianças. Para arranjar o país, precisa desarranjar estruturas. Mexer em interesses, alterar zonas de conforto, rever regras que não se sustentam mais. Tudo isso tem grande potencial mobilizador contrário. Some-se uma oposição afeita ao combate e com total disposição para isso.
Na política, então, a situação não é diferente. Temer tem a obrigação de prestigiar, estimular, proteger e valorizar a Operação Lava-Jato. Se não fizer isso, o povo o tirará do cargo. Simples assim. Porém, a continuidade dessas investigações, que terão um inequívoco resultado positivo para o país, gerarão muitas turbulências na classe política. Não faltará quem queira debitar ao governo, como já se viu em outros períodos, a culpa por não ter abafado os casos de corrupção e protegido companheiros. Seria um absurdo inaceitável. Mas o presidente interino precisará mover-se nesse verdadeiro fio de navalha.
Ainda nesse aspecto, o mandato precisará sustentar a forte maioria parlamentar que constituiu. Fez isso distribuindo quotas do governo, infeliz contingência do nosso vencido presidencialismo de coalizão. Também não há mais dúvida sobre a necessidade de reforma política. A questão está em como e quando fazer. Isso mexe nos interesses de quem já é detentor de mandato e se elegeu por meio das atuais regras do jogo. Ou seja: a própria base de Temer. Se mexer no vespeiro, com propostas transformadoras, o novo governo terá muitas resistências internas. Mas se nada fizer, o descrédito da população se manterá e aumentará.
A frase que resume bem toda essa situação foi usada pelo ministro Henrique Meirelles: vamos devagar porque nós temos pressa. É a contradição de que falo. Temer tem pouco tempo, mas não poderá olhar para a popularidade momentânea. A conquista da confiança talvez navegue, antes, por mares ainda mais tormentosos. Sim, ainda mais do que vivemos até aqui. E apenas num segundo momento, se tudo der certo, haverá de chegar um momento melhor. Ou não. A tarefa não é nada fácil.
Se Michel Temer souber dar passos sólidos e consistentes, mesmo que tenha dificuldades – e terá –, poderá salvar sua passagem perante a história. E recolocar o país nos trilhos. Caso isso não ocorra, chegará ao final do mandato, seja de seis meses ou até 2018, derrotado. E com o país, o que é pior, estará em uma crise ainda mais grave. Mesmo com desconfiança, o brasileiro tem esperança e quer que dê certo. Mas a bola está com Temer.
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