36ª edição Fórum da Liberdade é marcado pelo sucesso de público e a qualidade dos debates

36ª edição Fórum da Liberdade é marcado pelo sucesso de público e a qualidade dos debates

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Um dos destaques do Fórum foi o painel que reuniu os governadores do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), e Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), e procurou debater os rumos da política brasileira

Em sua 36ª edição, o Fórum da Liberdade reuniu, na quinta-feira  e sexta-feira dias 13 e 14, no Centro de Eventos da PUCRS, em Porto Alegre, mais de 4 mil pessoas. A programação contou com painéis, entrega de prêmios e um almoço para empresários.

Um dos destaques do primeiro dia do Fórum foi o painel que reuniu os governadores do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), e Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), e procurou debater os rumos da política brasileira. O mineiro começou a conversa lembrando da recusa ao primeiro convite que recebeu do seu partido para concorrer a um cargo público. Teve insônia e, após muito pensar, resolveu aceitar a proposta, mas contou que foi a um psiquiatra para obter um atestado de que estava mentalmente são.

Zema demonstrou preocupação com o Brasil atual e citou a necessidade de os liberais melhorarem sua comunicação. Por exemplo, ideias como “privatiza tudo” podem ser mais assustadoras do que empolgantes para o grande público. “Temos de levar ao grande público que queremos gerar mais empregos e que quem quer empreender não vai ter obstáculos”, ressaltou.

Leite também lembrou do início de sua carreira, que foi o inverso da história de Zema. O tucano entrou para a política aos 19 anos. O governador também citou o começo de seu governo, com salários parcelados no Executivo e sem dinheiro para investimentos. “Não há um país que tenha tido sucesso no setor privado com o setor público desarranjado”, salientou.

O governador gaúcho concordou que o rumo do país não é positivo, e exemplificou com a interferência do governo federal no Marco do Saneamento. “As pessoas não querem uma empresa de saneamento. Elas querem saneamento”, declarou. “Em 60 anos, a empresa estatal fez 20% do saneamento necessário no Rio Grande do Sul”, criticou, citando que o governo federal ainda quer dar mais uma chance para essas empresas, enquanto que a solução é abrir o mercado para o setor privado.

Os dois governadores passaram em seguida a responder a perguntas enviadas pelo público. Sobre as dificuldades nas eleições, Zema classificou os partidos dele e de Leite como “problemáticos”. Leite concordou que há uma crise de identidade no PSDB e preconceitos em relação a grupos. E falou sobre as próximas eleições presidenciais: “Quando me perguntam sobre 2026, digo que vou estar ao lado de uma alternativa a Lula e Bolsonaro. Quero estar com Zema, com Tarcísio (de Freitas, governador de São Paulo), contra o que está aí. A gente vai para a eleição com sonhos e esperanças, e não somente para evitar este ou aquele. Quero fazer uma reflexão profunda dentro do partido”.

Prêmios Liberdade de Imprensa e Libertas

Dois prêmios tradicionais do Fórum da Liberdade foram entregues neste primeiro dia. A jornalista Leda Nagle recebeu o Prêmio Liberdade de Imprensa (foto em destaque de pauta). Ela falou por transmissão pela internet por questões de saúde. “Neste momento, a liberdade de imprensa está muito comprometida. Fui ser jornalista por acreditar que poderia mudar o mundo. O jornalismo está opinativo demais e em uma direção só, e eu achava que deveria ser muito mais plural”, criticou.

Leda disse estar muito feliz pelo prêmio, e celebrou eventos que abrem os olhos para os problemas do país. “Um povo melhor formado consegue escolher melhor seus governantes”, declarou.

Flávio Augusto da Silva recebeu o Prêmio Libertas, conferido a empreendedores que se destacam no trabalho pela valorização dos princípios da economia de mercado e pelo respeito ao Estado Democrático de Direito. Logo após, em pé no palco e interagindo com a plateia, ele centrou sua explanação no questionamento sobre o uso da palavra “ambição”. “Falar de desejos me leva a falar de ambição. Uma palavrinha demonizada por alguns. E essa palavra é frequentemente confundida com ganância. Já pessoas que têm ambição são pessoas que têm sonhos. O mundo que conhecemos é resultado de pessoas ambiciosas”, defendeu. Ele provocou o público para que pensasse em como aumentar a ambição.

O empresário, criador da rede de escolas de idiomas Wise Up, exaltou a livre iniciativa e parabenizou o IEE pela realização do Fórum. Aproveitou para incentivar o empreendedorismo. “Eu, como empresário, tenho uma missão, que é gerar lucro. E para isso só tem uma forma, que é gerando valor, gerando empregos”, reforçou, exaltando quem tem coragem de empreender no Brasil.

Flávio se encaminhou para o final de sua palestra contando uma história que ocorreu em Porto Alegre. Tinha 20 anos, ainda era pobre e um chefe o chamou para ir na casa dele. Flávio nunca tinha visto uma casa como aquela. No dia seguinte, tinha café da manhã servido. Eram coisas que não conhecia. Em seguida, surpreendeu a todos ao chamar o então chefe, que assistia na plateia. E revelou que depois daquela experiência, desejou ter a vida igual à dele, e conseguiu com ambição. “O Brasil precisa de homens e mulheres ambiciosos”, finalizou.

O padre liberal

Quem abriu o dia de debates nesta quinta-feira foi o padre católico Robert Sirico. Ele descreveu passagens da Bíblia para ilustrar ideias liberais, como a defesa da propriedade privada. “Se você não tem propriedade, não tem liberdade”, afirmou. Sirico lembrou de sua vida de jovem, na Igreja, quando entrou em contato com a ideologia socialista e, ao buscar mais informações, passou a contestar esses dogmas. O estudo o levou a entender que o liberalismo teria mais a ver com a proposta cristã.” Comecei a ler de forma sistemática. Estudei história, filosofia, economia. O melhor do cristianismo é quando ele tenta tirar poder do Estado”, disse.

Aberto espaço para perguntas, um dos questionamentos foi sobre qual deve ser o tamanho do Estado. Onde ele deve atuar? “Acho que o Estado precisa garantir a liberdade humana e o direito à propriedade privada, senão não resolverá os outros problemas”, opinou. Sirico questionou ainda a ideia socialista de distribuição de riqueza. “As pessoas não saem da pobreza com redistribuição de riqueza. Não é distribuição de renda, é necessária criação de renda”, concluiu.

Último dia do Fórum: liberdade, agro e inovação no centro dos debates

O segundo e último dia do Fórum da Liberdade foi recheado de debates, com 20 painéis e palestras em mais de 12 horas de evento no Centro de Eventos da PUCRS, em Porto Alegre. Além das conversas, que giraram em torno de temas como agronegócio, urbanismo, liberdade de expressão e muitos outros, houve lançamento de livros, sessões de autógrafos, apresentações culturais e, ao final, uma festa de encerramento.

A 36ª edição do Fórum da Liberdade teve como tema “Alice no País das Liberdades”, e quem esteve no local observou que o ambiente por si levava a uma submersão no mundo inspirado na obra de Lewis Carrol. A decoração do Centro de Eventos remetia a detalhes do livro, de personagens e até mesmo de mobiliário. Ao final, a proposta do Fórum foi cumprida com sucesso, e a questão da liberdade se destacou no centro dos debates.

Foram dois dias com mais de 25 horas de conversas e trocas de ideias. Cerca de 5 mil pessoas participaram, enchendo os espaços onde ocorreram os painéis e palestras. Quatro escolas levaram mais de 500 alunos para se inspirarem com as histórias de empreendedorismo e liberdade. É a preparação para o público futuro do Fórum da Liberdade, que se aproxima dos 40 anos de existência.

Agro: vilão ou bolo do crescimento brasileiro?

Um dos painéis mais importantes da sexta-feira foi sobre o agronegócio e reuniu Antônio Cabrera, ministro da Agricultura no governo Collor, a influenciadora digital Camila Telles e Joaquim Leite, ministro do Meio Ambiente na gestão Bolsonaro.

O passado do setor foi lembrado por Cabrera. Ele citou problemas que havia anteriormente no Brasil para os produtores, com importação de carne e até apropriação de produção pelo governo. Uma condição inimaginável na comparação com o cenário atual.

Camila salientou que se não fosse o cerrado, talvez o Brasil não tivesse passado de importador para exportador. Foi para lá que o agronegócio se expandiu e se tornou o grande sustentáculo econômico do país. Ainda assim, é questionado e apontado como vilão.

Para Camila, o agro precisa ser mais valorizado, e ouvir críticas feitas por “quem está em um escritório com ar-condicionado” não é algo fácil. “O problema do mundo não é o pum da vaca”, citou, em relação à poluição do ar por gases do rebanho. São acusações de “pessoas que querem arrumar o planeta mas não arrumam a própria cama”, diz. “Está na moda ser contra tudo sem entender nada”, acrescentou.

Camila falou de uma pesquisa sobre 60% das citações sobre agro em materiais escolares são negativas. A culpa, segundo ela, é da falta de capacidade do agro de “se vender”.

Joaquim Leite comentou sobre licenciamentos, classificando as leis ambientais do Brasil como as mais rígidas do mundo. “É um desafio para o Congresso garantir que pode produzir um novo projeto de lei sobre licencimento”, salientou, defendendo o licenciamento autodeclaratório para casos mais simples e regras mais duras para questões complexas.

Um olhar sobre as cidades

Do painel “Planejamento central ou ordem espontânea?” participaram o pesquisador e urbanista francês Alain Bertaud, o empresário, advogado, ativista político e publicitário alemão Titus Gebel e o economista Adriano Paranaiba.

Bertaud se debruçou sobre o papel do urbanista, que, para ele, é desenvolver as infraestruturas para as pessoas poderem se locomover, e isso deve ser feito dentro da ordem que emerge da acomodação espontânea dos habitantes das cidades. “Alguma regulamentação é indispensável, mas qualquer regulamentação do consumo, do espaço, de terra, previne o desenvolvimento da cidade. Não existem casas suficientes para as pessoas indispensáveis, que são as que estão trabalhando. Se a regulamentação não tiver utilidade, temos que removê-la”, afirmou.

Gebel mostrou ideias baseadas no preceito de que a governança é um serviço, e, por isso, pode ser realizada pelo setor privado. “O operador oferece serviços de governo e recebe uma taxa por isso”, exemplificou.

Paranaíba construiu uma ligação entre urbanismo e mobilidade urbana, cercada de muitas críticas ao panorama brasileiro. “O sistema de transportes no Brasil não funciona. Por quê? Porque esse sistema é resultado da forma como estruturamos a cidade. Se nós temos problema de trânsito em uma cidade, o planejador urbano falhou miseravelmente para pensar aquela cidade”, argumentou. Ele fez críticas ao excesso de regulamentação, que faz com que o pobre acabe indo para a favela porque o solo é muito caro para ele construir dentro das regras. Defendeu quadras pequenas para facilitar o transitar das pessoas, baseado em um livro da americana Jane Jacobs: “No Brasil, é estranho que muitos arquitetos gostam da Jane Jacobs, mas são extremamente planejadores do espaço urbano. Na Escola Austríaca, vemos as ideias da Jane Jacobs como muito libertárias”.

Você deveria dizer tudo o que acha?

Liberdade de expressão e o politicamente correto foram o tema do painel que reuniu o músico e apresentador João Nogueira (o Rasta), a jornalista e escritora Madeleine Lacsko e o cientista político Magno Karl.

Magno Karl iniciou o debate lembrando de Mamonas Assassinas, Renato Russo, Jô Soares e outros para mostrar como o discurso politicamente correto avançou para o cancelamento. “Nunca houve expressão sem consequências. A não responsabilização de alguém por um ato é a maior ofensa que pode ter para a República”, apontou. No entanto, hoje, o que vivenciamos, de acordo com ele, é que as pessoas ofendidas não precisam ter conhecimento sobre o caráter nem conviver no meio ambiente ou saber o que foi falado na suposta ofensa. “Criamos uma fábrica de pessoas cujas ideias estão na franja do debate público, mas com o poder de acabar com a vida alheia”, declarou.

“Eu bloqueio”, disse Madeleine, sobre as provocações e ofensas de que é alvo na internet. “Não sou obrigada a aguentar quem me ofende, mas não posso impedir ele de falar. Para ela, o que não é negociável é a dignidade humana. “A dignidade humana não depende do grupo em que a pessoa está. Você despe a pessoa da dignidade tirando nome, botando apelido de vilão de filme. Sem perdão, compaixão e redenção, não há sociedade humana”, criticou. Madeleine anunciou a ideia de criar um instituto para defender quem tem sua liberdade de expressão cerceada hoje no Brasil.

Rasta fez um apanhado histórico sobre o debate, a linguagem e o entendimento entre as pessoas. Ele defende que qualquer opinião, inclusive a mais estapafúrdia possível, não pode ser censurada. O grande guia deveria ser a consciência individual, entende. “Mas, ao mesmo tempo em que sou a favor de que você possa falar o que bem entender, também defendo que possa ser ignorado. A verdade importa e devemos ser absolutamente livres para dizermos o que pensamos”, concluiu.

Inovação

Um papo sobre inovação e tecnologia reuniu José Galló, ex-CEO e atual presidente do conselho da Renner, José Renato Hopf, cofundador da Getnet e da 4all e presidente do South Summit Brazil, e Cassio Bobsin, fundador e CEO da Zenvia e fundador do WOW Aceleradora.

Galló contou histórias de encantamento dos clientes com a Renner ao longo do tempo. O segredo do varejo, ele resumiu da seguinte forma: é seguir o que o cliente manda. Depois avançou para questões atuais de tecnologia e centrou comentários nos algoritmos da internet, exaltando sua utilidade mas também destacando os riscos do seu mau uso. “Todas as inovações são um pêndulo. Diziam que as lojas físicas iam acabar. Depois, que elas estavam voltando. O pêndulo às vezes está para cá e às vezes está para lá”, declarou.

Hopf destacou o avanço de Porto Alegre com o South Summit, que levou a rede hoteleira da cidade a lotar. Ficou claro que a cidade mudou e está mudando, o que traz otimismo para os empreendedores, como Bobsin, cuja fala envolveu os desafios e as benesses da área de startups. Foi um encerramento de painel de olho no futuro.

Alice no País das Liberdades foi tema do Fórum desse ano. Crédito das imagens Edith Auler