Neste fim-de-ciclo da globalização como a conhecemos desde o Consenso de Washington e da formação da União Europeia dos anos 1990 a eleição de Donald Trump como presidente da maior nação do mundo é apenas mais um evento que fortalece o caráter da mudança da ordem mundial. Não o bom ou mau caráter, apenas o caráter. Cita-se os resultados eleitorais ou de referendum como os da Colômbia, no caso do acordo governo-Farcs, o Brexit no Reino Unido, e mesmo as eleições municipais no Brasil neste 2016. Todos pela mudança, mesmo que como uma negação do presente e uma busca nostálgica do passado pré-globalização.
Quando foi promulgada a Constituição Brasileira em 1988, iniciou-se um período construtivo em que as instituições deveriam se adaptar tanto aos novos ventos mundiais, vide a queda do Muro de Berlim, quanto aos valores democráticos, a serem aferidos por eleições diretas em todos os níveis – a presidencial de 1989, na base do Estado Democrático de Direito. Desde então os direitos têm sido definidos, e financiados por verbas que cresceram em média 6,5% acima da inflação, e 4,5% acima das crescentes receitas todos os anos. Mesmo assim é pouco. Há muito se buscava a definição dos direitos, individuais e coletivos, e a governança para honrá-los. Cumpriu-se essa escolha – mas os limites são concretos, veja-se a situação falimentar de estados como o Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul, e trilhando para esse caminho a maior parte das prefeituras e dos estados, e mesmo a União.
Aos poucos foi ficando claro que essa tendência não poderia se manter indefinidamente, porque há limites para a arrecadação, e porque universalizar os direitos e dar-lhes qualidade requer eficiência dos governos, e uma distribuição menos corporativa e desigual dos frutos da produção nacional. Novas classes apropriaram-se do que deveria ser distribuído a todos. Os donos do país. A política foi perdendo capacidade de cumprir sua função de identificar e resolver os problemas do dia-a-dia, e a população foi manifestando-se exigindo mudanças e combate à corrupção desenfreada que foi ficando evidente graças inclusive ao imenso crescimento das redes sociais. Aliás, as últimas eleições/referendos já citadas mostram que a mídia, amparada pelas pesquisas eleitorais, errou tanto quanto os políticos governantes na identificação da natureza e da direção do voto. As informações estavam ali, ao alcance deles, mas tanto quanto os políticos de forma geral através dos partidos e dos parlamentos, a mídia e os institutos de pesquisas “não ouviram a voz das ruas”. Numa arrogância incontida, desprezaram os sinais claros e barulhentos – não apenas os da “maioria silenciosa”, mas os das manifestações em praças e ruas públicas. Arrogância aliás de quem pensa que manipula à sua vontade. A liberdade freia isso.
Raciocínio semelhante pode se aplicar à globalização dos 1990, que trouxe imensos resultados mas desnudou as imensas diferenças, sendo acompanhada por insanas guerras que nos remetem a tempos passados, desde os medievais, com o horror das cenas das hordas de imigrantes tentando se refugiar ou participar do “mundo novo” gerado na América e na Europa, e fugindo do terror islâmico e da pobreza e das tiranias africanas. Trump é apenas um vencedor a mais nessa era que busca barrar a abertura trazida pela globalização. Para o que vir depois logo saberemos.
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