O recado das urnas para os partidos políticos | Por Germano Rigotto

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É possível fazer uma abordagem ideológica das últimas eleições municipais. O entendimento, segundo o qual o eleitorado brasileiro fez uma inflexão para a centro-direita, é no mínimo plausível. Entretanto, entendo que a população não fez – e tampouco costuma fazer – esse tipo de raciocínio, pois decide de maneira muito mais direta e racional do que as correntes de pensamento e seus rebuscamentos.

As escolhas deste ano mostraram, de um modo geral, uma tendência pela renovação e a opção por discursos retos e diretos, sem tantos rodeios. Politicamente, ganhou mais quem se posicionou de maneira mais clara. Do ponto de vista administrativo, ganhou mais quem fez gestões eficientes ou trabalhou propostas objetivas para o futuro. Não foi a verborragia ideológica que se impôs, mas a transparência de posições sobre temas decisivos para a sociedade.

Ao recuperar essas conclusões, trago à baila um encaminhamento que pode ser valioso para os partidos políticos brasileiros. O eleitor, como seu viu, mostrou apreço por quem tem posicionamento – e o aborda de maneira clara, mesmo que gere desconforto em determinados públicos ou setores de interesse. Não importa tanto a ideologia, como eu disse, mas que as ideias se revelem e tenham coerência. O povo votou em quem se fez entender, se permitiu verdadeiramente decifrar.

Por que isso é importante para os partidos? Porque eles são as primeiras instituições, no terreno da política, que precisam organizar pessoas em torno de propostas, propósitos e valores. São as fontes primárias, portanto, de posicionamento. São a antítese da visão totalizante, que imagina representar a todos o tempo todo. Representam, como diz o nome, parte da sociedade. E, por isso mesmo, respeitam a divergência, sem temor em deixar clara sua existência. Posicionam-se, pois.

Quando partidos não ocupam esses espaços, restam apenas as personalidades. E foi o que vimos, mais uma vez, no Brasil. Claro que houve um movimento decifrável de forças no quadro partidário, mas, no todo, as figuras se sobrepuseram às agremiações. Os partidos mais perderam do que ganharam. As individualidades, por meio de seus méritos e de uma organização particular de ideias, preencheram esse vácuo de sofreguidão existencial das legendas.

Dois motivos estão entre os principais para isso. O primeiro é o excesso de partidos, muitos dos quais se transformaram em instrumentos de negociata envolvendo o horário de televisão e o fundo partidário. É um absurdo que o país financie quase 40 agremiações políticas. Não há ideias, ideologias ou mesmo forças sociais capazes de preencher tamanho espectro. Isso faz com que percam significação no imaginário cultural da nação: tudo o que fazem tem pouca ou nenhuma importância.

O segundo grande motivo é o pragmatismo fisiologista da maioria das legendas, que facilmente abre mão das suas ideias para mergulhar em projetos de poder. O adesismo aos governos tem como causa também a contradição do nosso sistema, que joga a composição da maioria parlamentar para depois da eleição – e não como fruto dela. Mas a culpa não é só do sistema; muitas vezes a coerência é rasgada para que quadros políticos abocanhem nacos de poder. Os projetos partidários, em vista disso, ficam em último plano.

Portanto, mesmo com movimentos difusos, a eleição deste ano mostrou que as pessoas estão procurando algo fora da geleia geral em que se transformou o quadro partidário brasileiro. Não precisa ser uma ideologia extremista, mas algo que reúna ideias mais claras, posições mais firmes e se mantenha coerente com isso. Os partidos que antes perceberem isso e se conectarem com esse eleitor órfão, terão grandes chances de crescer de maneira consistente e orgânica. Mas alguma legenda terá entendido o recado das urnas? E conseguirá trilhar esse caminho? A ver.

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