O que aconteceu com o voo 3054 da TAM, há 10 anos, não foi “acidente” porque a tragédia era previsível. O Brasil vivia o limiar de um caos aéreo. Grandes companhias haviam quebrado, em crescente concentração no setor. Primeiro a Vasp e a Transbrasil desapareceram. Quando a Varig encerrou atividades, em 2006, Gol e TAM dominavam o mercado, sem estar preparadas para isso. Isso aconteceu apesar de toda a luta que por 3 anos e meio a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Varig, que presidi, travou, justamente às vésperas da solução, pois estourou o escândalo do Mensalão em 2005 e o governo travou nessa e em outras inciativas também. Em setembro de 2006, quando um jato Legacy se chocou no ar com um Boeing da Gol, causando a morte de 154 pessoas, evidenciou-se a ligação entre o despreparo do setor e a consequente impunidade em geral, e a dos responsáveis por acidentes desse porte, em especial.
Falta de investimentos, distanciamento das estatais do setor para a necessidade de gestão em setores sensíveis como o do transporte aéreo, ganância, improviso das companhias aéreas, se aliaram à incapacidade do governo Lula em administrar e fiscalizar a aviação comercial. Da tribuna, o deputado Júlio Redecker, líder da Minoria, denunciou o quanto estava perigoso viajar. Consciente dos riscos, ele havia participado de plantões nos aeroportos para recolher vinte mil assinaturas para a instalação da CPI do Apagão na Câmara.
Uma semana depois do alerta, Júlio estava na lista de pessoas a bordo do Airbus da TAM, que saiu de Porto Alegre com destino a São Paulo e derrapou na pista molhada e curta de Congonhas. Naquele dia morreram 199 pessoas, noventa e oito gaúchas. Cada uma delas, vítima de uma tragédia anunciada, há meses. Redecker interpelava as autoridades, pedindo que “tomassem vergonha e olhassem para o setor que estava prestes a gerar acidentes”. Partiu cedo demais, poderia estar contribuindo para com a renovação de que o Brasil tanto precisa.
Morreram com ele sete representantes do grupo “Tricoteiras dos Precatórios”, aposentadas e pensionistas do Rio Grande que tricotavam na praça em frente ao Piratini, em protesto pelo não-pagamento de precatórios de governos anteriores – que coube a mim recomeçar a quitar fazendo aprovar e promulgar uma lei para isso. Levavam uma manta de 200 m com elas.
Era meu primeiro ano à frente do Governo do RS. Chamei todo o governo, e em especial o IGP-Instituto Geral de Perícias, para agir imediatamente, para ajudar no trabalho de identificação, em parceria com o de São Paulo, para abreviar a angústia das famílias. Em reunião com o então ministro da Defesa, Nelson Jobim, e parentes das vítimas, exigimos uma reparação, que jamais chegou, e que priorizasse a solução para o setor em crise.
O pior desastre da nossa aviação agravou o caos aéreo, e o governo se viu obrigado a reconhecer o que vinha negando. O relatório final, divulgado mais de dois anos depois, em outubro de 2009, não apontou responsáveis pela tragédia,. Não há punidos. Por isso, a cada 17 de julho é preciso lembrar todas as 199 vidas que tiveram ali abortados projetos e sonhos, e suas famílias, que sofrem sua falta e cobram por Justiça. É o que buscamos todos.
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TAM: Uma tragédia anunciada e impune, 10 anos depois – Yeda Crusius
17 de julho de 2017 at 09:47[…] Data do Artigo: 17/07/17 Fonte: Do site Rede de Opinião […]